sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Microfones na liturgia

Pe. Geraldo Martins

A capela não cabe mais que cem pessoas. Os bancos estão bem dispostos, a ventilação é boa, o sistema de som atende perfeitamente, favorecido por ótima acústica. Faltando entre 30 e 40 minutos para a missa, os membros da equipe de canto são os primeiros a chegar. Só para montar a parafernália instrumental levam de 15 a 20 minutos. Trazem a própria caixa amplificada (às vezes, mais de uma) e os microfones, quase sempre melhores que os da capela e, dificilmente, menos que cinco.

Concorrendo com os microfones estão os instrumentos que variam de violão a guitarra, passando por teclado, bateria e contrabaixo. Tudo montado, é hora de repassar as músicas que, com raras exceções, atendem mais ao gosto dos músicos do que à exigência do mistério que se celebra. Cantam na liturgia e não a liturgia, com a desculpa de que a celebração precisa ser animada.

Estas cenas têm se tornado muito comuns em nossas comunidades. Não faz muito tempo, pude ver tudo isso numa comunidade cuja celebração presidi. Lembrei-me logo de uma reunião em que um bispo falava desta questão. “Quando vou celebrar numa comunidade, a primeira coisa que faço é trocar o meu microfone com algum dos cantores. Os microfones deles são muito melhores que os da Igreja”, disse o bispo, arrancando gargalhadas e o assentimento dos presentes.

Nas comunidades onde isso acontece, os vocalistas se esbaldam nos microfones. O volume, do tipo ‘quanto mais alto melhor’, parece ultrapassar o limite tolerável dos decibéis. Resultado: a liturgia fica cansativa e barulhenta. Nem se consegue perceber se a assembléia está cantando ou não. Faz lembrar mais uma platéia de espectadores que uma assembléia que concelebra.

Chama atenção, ainda, a forma variada com que os puxadores de canto se posicionam diante dos microfones: uns preferem o pedestal, outros não abrem mão de segurá-los (isso garante a posse). De uma forma ou de outra, a impressão que fica é a de que vão engolir o microfone, tal a proximidade que o colocam da boca.

O mal uso do microfone, contudo, não tem sido privilégio dos cantores. Está virando moda, também, o comentarista se apossar dele para responder à missa. Em alguns lugares, ele até ganha a ajuda solidária (ou seria concorrência?) dos cantores. Que pena! Além de tornarem a celebração mais barulhenta, acabam roubando da assembléia seu direito de participação, tratando-a como ignorante, que não sabe responder às orações da celebração. Seria tão bom se o comentarista usasse o microfone somente para comentar e não para responder as orações da missa!

Certamente muitos agem assim de boa fé, mas alguém precisa corrigi-los, dar-lhes formação adequada. Até que ponto, porém, estão abertos a isso? Já ouvi testemunho de padres que tiveram sérios problemas com as equipes de canto por discordarem das orientações no uso dos microfones e dos instrumentos. No espírito da ‘conversão pastoral’ exigida pela Conferência de Aparecida, eis aí um ponto que merece nossa reflexão.

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